Porém meu entusiasmo foi por água abaixo quando atingi uma velocidade mais elevada e senti uma flutuação incômoda na dianteira do carro. No auge da minha ignorância à época, imaginei que pudesse ser fruto da baixa quilometragem do carro mas, como a situação persistiu com o passar do tempo, resolvi investigar.
Verifiquei alinhamento, balanceamento, cambagem e amortecedores, em várias oficinas para obter um parecer correto, mas não havia nada errado. Questionei então a concessionária e a Ford, que provavelmente fizeram os mesmos testes que eu, mas nada foi encontrado.
Intrigado com o problema, passei a analisar testes feitos por publicações especializadas assim como a opinião de donos de Ford Ka pela internet afora. Uns mencionavam a flutuação da dianteira, outros não. Diante disso, comecei a desconfiar que não era um problema padrão no carro, então tinha como resolver.
Pedi a dois amigos donos do mesmo modelo que me deixassem dirigir seus carros na mesma condição que encontrei a flutuação do meu carro. Ambos haviam sido comprados na mesma concessionária, com o mesmo pacote de equipamentos encontrado no meu. Para a minha surpresa, em um dos veículos encontrei a incômoda instabilidade, enquanto no outro o comportamento foi correto.
Observei os carros procurando diferenças entre eles além da cor, mas não havia nada de aparente, exceto o protetor de cárter, que um dos carros possuía e o outro não, sendo que aquele que apresentou comportamento irregular era o que estava equipado com o protetor, assim como o meu carro.
Não achei nenhuma foto no Google para ilustrar, nem possuo foto da época, mas o protetor de cárter ficava meio que mal instalado no Ka, deixando uma distância considerável da peça para o motor, muito bem visível quando se observava o carro de frente.
De acordo com as minhas noções básicas de aerodinâmica, desconfiei que o formato e a montagem do protetor de cárter pudesse estar gerando alguma força de sustentação, ou seja, o fluxo de ar encontrava mais dificuldade para passar por baixo da peça do que por cima, sendo esse o comportamento aerodinâmico que ajuda um avião a se manter no ar, por exemplo, como é bem explicado na figura abaixo.
Força de sustentação muito bem explicada. Fonte |
O Ford Ka, assim como os carros brasileiros, possui uma altura de rodagem elevada para sobreviver a lombadas, buracos e valetas das nossas ruas, o que prejudica a aerodinâmica, permitindo uma passagem maior de ar por baixo do carro, deixando este sujeito à ação da força de sustentação, que deve ser anulada pela downforce gerada pelo veículo. Mas como a velocidade necesária para que essas forças comecem a influenciar a direção deve ser muito mais alta do que os limites de velocidade em nossas estradas, os consumidores preferem um carro que não raspe em lombadas do que um carro totalmente estável a 160 km/h.
Voltando ao protetor de cárter, aproveitei a revisão de 10.000 km e solicitei que fosse retirada tal peça do meu carro. Feito isso, coloquei o pé na estrada e fui comprovar a minha teoria. Como eu esperava, não houve nenhuma flutuação, o carro estava totalmente estável, nem parecia o mesmo.
Para tirar a contraprova, levei o carro à oficina de um amigo, que instalou o protetor de cárter de volta no carro. Não foi surpresa ver que a flutuação e instabilidade voltou. Diante disso, eu tinha duas escolhas. Ou eu instalava os apêndices aerodinâmicos de gosto duvidoso do Ka ST (abaixo), para desviar para os lados o ar que passaria entre o protetor de cárter e o motor, ou então deixava meu cárter à mercê da própria sorte.
Não curti. Foto: Divulgação. |
Bem, resolvi aproveitar a boa altura de rodagem do compacto e deixei o cárter desprotegido, apesar de rodar mais na cidade do que a velocidades aonde as forças de sustentação fazem alguma diferença.
Mas para a linha 10/11 a Ford disponibilizou um novo modelo de protetor de cárter para o compacto, conforme na imagem abaixo em comparação com o antigo, que passou a ser melhor fixado no carro, sem deixar qualquer espaço para o ar passar com velocidade por cima da peça.
Agora sim! Fonte |
Fiquei curioso pela nova peça e instalei-o no meu carro, que não apresentou nenhuma instabilidade na dianteira, resultante da sustentação. Ou seja, mais uma informação para confirmar que o protetor de cárter antigo era um inimigo da aerodinâmica do compacto.
Marcelo Silva
Não sabia que o protetor de carter poderia ter esse efeito na estabilidade do carro. Pode parecer estetico mas pode gerar um risco para o condutor. Otimo post!!!!
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